Prólogo
De quem desejar orientar-se sobre a fundamental diferença doutrinária entre o Catolicismo e o Protestantismo, procuro ir ao encontro com parcimônia de palavras.
Clareza e certeza é o que viso neste modesto trabalho, abstraindo do resto. Sei que existem obras primas sobre esta matéria, por exemplo: А Igreja, a reforma e a civilização, por Pe. Leonel Franca, — de maneira que este folheto poderia parecer coisa supérflua. Contudo, não o acho, pois não pretendo elucidar todos os pontos, nem dar todas as provas de um único ponto: tenciono escrever para aqueles que, estando no meio da luta pela vida, não dispõem de tempo para ler e estudar um curso de apologia e, não obstante, desejam saber e resolver a questão cientifico-religiosa entre o Catolicismo e o Protestantismo. Eis o meu escopo. O benévolo leitor julgue por si, se consegui o meu proposito.
O autor, Frei Ivo Westerveld.
Sumário
- Capítulo 1. Como Jesus fundou a sua Igreja
- Capítulo II. São Pedro, primeiro chefe da Igreja
- Capítulo III. A Igreja é infalível quanto à fé e à moral e permanecerá até ao fim do mundo
- Capítulo IV. Qual é a verdadeira Igreja de Cristo?
- Capítulo V. O Protestantismo
Capítulo I. Como Jesus fundou a sua Igreja
Quando Jesus andava neste mundo, Seu proceder foi inteiramente excepcional. Filho de mãe pobre, de nome Maria, desposada com um modesto carpinteiro, chamado José, não frequentou aulas. Aos trinta anos de idade começou repentinamente, sem preparação alguma, confiando unicamente em si mesmo, a pregar uma nova doutrina, dizendo-se Filho de Deus vivo. Jamais mortal algum, antes ou depois de Jesus, se lembrou de proclamar-se Deus. E Ele provou a Sua divindade, Sua missão e doutrina com inúmeros milagres, cada qual mais estupendo. Enfim, pôs remate a todos: ressuscitou ao terceiro dia como claramente predissera.
Para provar ainda mais Sua divindade e, por conseguinte, a de Sua doutrina, de Sua obra e de Seu reino, escolheu pescadores, simples pescadores ignorantes, para fundar um reino acima de todos os reinos: são baldos de toda instrução superior, sem jurisprudência, sem filosofia, sem diplomacia, sem estratégia; falta-lhes tudo: dinheiro, recursos, exercícios, simplesmente tudo.
Assim começaram a loucura da pregação, contrariando em tudo às inclinações humanas, declarando guerra à soberba, ao luxo, à riqueza, à sensualidade, ao gozo e à liberdade desenfreada, a tudo que o homem por natureza estima; eles declaram guerra sem tréguas a todas as religiões pagãs, a todos os deuses que não são o Deus deles e daí a todas as instituições pagãs, a todos os sacerdotes pagãos, a todos os governos pagãos.
E milagre dos milagres: eles venceram e estão vencendo ainda.
O que parecia loucura rematada, revela-se sabedoria e poder divino, avança, derruba, triunfa.
Contra os doze pescadores desarmados, ignorantes, as legiões romanas, jamais vencidas, se põem em movimento, marcham, desembainham os gládios luzentes e afiados. Agora, porém, se lhes opõe outro exercício, capitaneado por pescadores, composto de gente inócua: homens e jovens sem armas, que nem querem defender-se, mas preferem oferecer sem resistência alguma os seus pescoços desnudados, para que sejam cortados; mulheres fracas, donzelas tímidas, até crianças.
Será possível que soldados briosos, que comandantes invictos se aviltem ao ponto de enodoar, sujar as suas espadas com sangue de gente pacata, inerme, até de mulheres e crianças? Sim. Fizeram-n’o!
O sangue inocente, inócuo, corre a rios, embebendo a terra: a espada romana fica desprezada, pois ficou machada de sangue imbele: a águia romana torna a ser simples ave de rapina, de garras sujas, manchada de sangue fraco, mais desprezível que o abutre, o urubu.
Após três séculos de luta inglória para os romanos, a cruz é plantada sobre o frontispício do Capitólio de Roma: Júpiter destronado jaz esmagado por terra, ainda húmida do sangue dos mártires da fé.
Os pescadores venceram, imolando o seu próprio sangue.
Assim se fundou o cristianismo, continuou pelos séculos, assim hoje ainda é: haja visto o México, a Hungria, a Turquia, a Rússia, a China: — em breve seguirão outros países. Eis o maior milagre de Cristo Deus: a fundação e extensão de sua Igreja.
A vitória de Jesus continua, é a vitória dos mártires pela fé.
Após dezenove séculos, Jesus ainda vence até no sexo fraco: o corpo débil, tenro, duma criança inocente jaz morto por terra, ainda verte sangue, mas a vontade ficou firme, inabalável, não se dobrou, mas triunfou da ferocidade satânica; foi assim no tempo dos Césares, e assim é hoje com os Calles, Lenines, Trotzkys, Bela Kuns, Stalins e outros demônios em carne humana.
O corpo sucumbe, mas a vontade, a alma, venceu, apesar de atrocidades inauditas. A doutrina de Cristo é sublime e sem comparação: é divina. A sua verdade fulge e brilha para esclarecimento dos bem intencionados, ofuscando os olhos do espírito aos demais, que não querem o triunfo da virtude.
Só Deus pode proceder e vencer assim.
Capítulo II. São Pedro, primeiro chefe da Igreja
Já durante a sua vida pública, Jesus prometeu a um apóstolo a chefia: foi a Simão, filho de Jonas. Logo ao encontrá-lo pela primeira vez, deu-lhe um cognome: Céfas, isto é, rochedo, pedra firme, inabalável. Mais tarde prometeu-lhe solenemente, na presença dos demais apóstolos:
«Tu és «céfas» e sobre esta «céfas» edificarei a minha Igreja e as portas do inferno não prevalecerão contra ela. A ti darei as chaves do reino dos céus; tudo o que ligares na terra, será ligado no céu, e tudo o que desligares na terra, será desligado no céu» (Mt 16, 18-19)
A tradução portuguesa deste texto da bíblia necessita duma explicação.
Lê-se nas bíblias portuguesas: «Tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja, etc.», como se Nosso Senhor Jesus Cristo tivesse usado de duas palavras diferentes. Jesus usou duas vezes da mesma palavra: céfas, rochedo, pedra firme, inabalável. Como, porém, é contra a índole da língua latina e portuguesa dizer a uma pessoa: «tu és uma pedra», houve adaptação e se traduziu: «tu és Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja, etc.». Devemos, portanto, saber que Jesus não falou assim, mas que disse: «tu és céfas e sobre este céfas edificarei, etc». Desta maneira, Jesus escolheu Simão Pedro para pedra fundamental, sobre a qual construiria a sua Igreja, que ia fundar.
Da mesma forma devem entender-se as palavras: «A ti darei as chaves do reino dos céus». Quem tem as chaves dum armário, duma casa, é o dono; quem tinha as chaves duma cidade fortificada, como outrora foi costume, era o chefe.
Ainda numa outra ocasião, Jesus dirigiu-se a São Pedro em particular:
«Simão, Simão, eis que Satanás pediu com instância para joeirar-vos como o trigo, mas eu roguei por ti, para a tua fé não naufragasse; e tu, depois de convertido, confirma teus irmãos» (Lc 22, 31-32)
Notemos aqui que Satanás pediu joeirar, isto é, tentar todos os apóstolos, e que Jesus orou especialmente só por um: Simão Pedro, para que este não vacilasse em sua fé.
Foi Pedro que recebeu a ordem de confirmar os seus irmãos, isto é, os demais apóstolos.
O que Jesus prometeu durante a sua vida pública, cumpriu depois de sua morte e gloriosa ressurreição, instituindo Simão Pedro, filho de Jonas, chefe de seu rebanho, isto é, de sua Igreja.
Lemos na Sagrada Escritura, que Nosso Senhor Jesus Cristo apareceu muitas vezes a seus apóstolos para confirmá-los na fé, ensiná-los, instituir sacramentos, etc. Numa destas ocasiões dirigiu-se a Simão Pedro e lhe perguntou (Jo 21, 15-16):
«Simão Pedro, Bar Jona, tu me amas mais que os outros?»
Simão Pedro, humilhado pela queda da noite da sagrada Paixão de Jesus, não ousou dizer simplesmente que sim, mas respondeu:
«Senhor, tu sabes que eu te amo»
Ao que Jesus replicou:
«Apascenta os meus cordeiros!»
Pela segunda vez Jesus lhe fez a mesma pergunta: «Simão Pedro, Bar Jona, tu me amas mais que os outros?» E Simão Pedro respondeu também na mesma forma: «Senhor, tu sabes que eu te amo». Ao que Jesus repetiu: «Apascenta os meus cordeiros!».
Pela terceira vez tornou Jesus a perguntar: «Simão Pedro, Bar Jona, tu me amas mais que os outros?» Simão Pedro, temendo que Jesus lhe ia predizer uma segunda infidelidade da sua parte, começou a chorar e disse:
«Senhor, tu sabes tudo, sabes também que eu te amo»
Então Jesus disse a Simão Pedro: «Apascenta as minhas ovelhas». Deste modo instituiu Jesus a São Pedro chefe de seu rebanho: dos cordeiros e das ovelhas.
Simão Pedro, por conseguinte, foi o primeiro chefe da Igreja de Cristo, residiu em Roma, onde foi preso, condenado e crucificado, de cabeça para baixo. O próprio Harnack, o mais insigne historiador protestante, confessou publicamente, num discurso, feito em Berlim perante um escol cientistas: «Wir, Protestanten, machen unslächerlich in den Augen der Katholicken, etc.» – Nós, protestantes, nos tornamos ridículos aos olhos dos católicos, repetindo sempre que São Pedro não esteve em Roma. Está mais que provado que São Pedro esteve em Roma e lá morreu, etc. Alego esta autoridade, reconhecida do lado dos protestantes, para não precisar aduzir todas as provas certíssimas da estadia e morte de São Pedro em Roma. Por conseguinte, o bispo de Roma, ou o Papa, é o legitimo sucessor de São Pedro e dai o chefe de toda a Igreja de Cristo. Com o Papa atual já temos mais de 260 Papas. Pelo que ficou dito, resulta claramente que aquela é a verdadeira Igreja de Cristo, que se submete e obedece ao sucessor de São Pedro ou ao Papa de Roma. Quem fica com o Papa, está na verdadeira Igreja de Cristo, e quem se afasta do Papa, afasta-se da Igreja de Cristo. Outra conclusão não é possível. As palavras de Cristo são claríssimas e não deixam margem a duvida. Temos que aceitá-las, se ainda quisermos ser cristãos.
Capítulo III. A Igreja é infalível quanto à fé e à moral e permanecerá até ao fim do mundo
A Igreja é obra divina e não humana. Jesus Cristo, o próprio Filho de Deus, feito homem para nossa Salvação, fundou-a para todos os tempos e todos os povos. Isto já resulta da própria obra da salvação. Jesus salvou a todos e fundou a Igreja para comunicar a todos a Sua doutrina e os meios da salvação. Ele fez uma obra perfeita: salvou-nos e cuidou de que todos quantos quisessem pudessem participar desta Sua salvação. No fim da vida, antes de por Seu próprio poder subir ao céu, ordenou a Seus apóstolos:
«Foi-me dado todo o poder no céu e na terra; ide, pois, e ensinai a todos os povos, batizando-os em nome do Padre e do Filho e do Espirito Santo, ensinando-os a observar todas as coisas, que vos tenho mandado. Quem crê, será salvo quem não crê, será condenado. E eis que eu estou convosco todos os dias até á consumação do século» Mt 28, 20; Lc 16, 15 e 16)
Este texto nos ensina em primeiro lugar que Jesus é o Senhor do mundo: do céu e da terra. Deus Pai entregou a Jesus o julgamento do gênero humano. Como tal, manda a seus apóstolos pregar toda a doutrina da salvação a todos os povos: ide e ensinai; manda-lhes comunicar todos a Sua graça: batizando-os, etc. Todos têm que crer e fazer o que os apóstolos ensinam. Quem crê e faz o que os apóstolos ensinam, irá para o céu: quem crê, será salvo, quem não crê, será condenado. Que grande promessa, mas também que ameaça terrível! E Jesus, segunda Pessoa da Santíssima Trindade, fica com os apóstolos até ao fim do mundo em todas as circunstancias e vicissitudes: estou convosco todos os dias até á consumação do século, isto é, do mundo. Daí a promessa é feita aos apóstolos e seus legítimos sucessores. O sucessor de São Pedro, como chefe da Igreja, é o Papa, bispo de Roma; os sucessores dos demais apóstolos são os bispos legítimos, subordinados ao Papa. Por este texto nos obriga Jesus a ouvir e aceitar as verdades reveladas que a Igreja, isto é, o Papa, com ou sem os bispos, nos propõe a crer. Se cremos e vivermos conforme esta crença, seremos salvos; ao contrário, seremos condenados. Se Jesus nos obriga a tanto, como indubitavelmente o fez, deve providenciar para que a Igreja, isto é, o Papa, com ou sem os bispos, não nos ensine falsidades, mas que tudo quanto ensinar sobre a fé e a moral seja exato: «eis que estarei convosco todos os dias até á consumação do século», «eu rogarei ao Pai, e Ele vos mandará outro consolador, o Espírito da verdade, que ficará convosco eternamente e vos ensinará a verdade,».
Pelo último texto vemos que Jesus promete pelo Pai o divino Espírito Santo, o Espírito da verdade, que ficará com os apóstolos eternamente, isto é, também com os sucessores dos apóstolos. Temos, pois, que ouvir o Papa como se ele fosse o próprio São Pedro. E assim se pode continuar a alegar textos que provam a infalibilidade da igreja, isto é, do Papa e dos bispos em união com o Papa.
Estes textos nos garantem ao mesmo tempo que a Igreja durará até ao fim do mundo. «Céus e terra passarão, mas minhas palavras não passarão», disse Jesus, que, portanto, ficará com a Sua Igreja até ao fim do mundo, pelo que esta não errará na fé, não será aniquilada.
Capítulo IV. Qual é a verdadeira Igreja de Cristo?
Quem tiver lido atentamente os três capítulos anteriores, sabe: a Igreja de Cristo é única e exclusivamente a Santa Igreja Católica, Apostólica, Romana. A Igreja Católica é a única, que começou com Cristo. As demais igrejas, que se chamam também cristãs, são todas de data mais recente: os Coptas, armênios, gregos, protestantes, etc.
Só a Igreja Católica data da era de Cristo e dos apóstolos. Só a Igreja Católica descende dos apóstolos, instituídos por Jesus Cristo.
Só o Papa de Roma é o sucessor legítimo de São Pedro e nenhuma outra igreja pode ufanar-se de ter em Roma um chefe, que é sucessor do príncipe dos apóstolos, São Pedro. Os papas numa série ininterrupta remontam até São Pedro. Todos os historiadores hodiernos são unânimes em o afirmar.
Só a Igreja Católica tem intacto o Símbolo dos Apóstolos, usado desde os primeiros séculos em toda parte.
Só a Igreja Católica administra aos seus fiéis os mesmos Sacramentos, que desde os primeiros séculos se administraram. A Igreja Católica ainda tem o mesmo sacrifício da Santa Missa, que, no essencial, data dos primeiros séculos, desde os apóstolos.
Por conseguinte: só a Igreja Católica, Apostólica, Romana é a Igreja de Cristo, única e verdadeira.
Leia também: Didaqué: A Instrução dos Doze Apóstolos
Capítulo V. O Protestantismo
São compreendidas debaixo deste nome as centenas de seitas protestantes, como luteranos, calvinistas, remonstrantes, contrarremonstrantes, batistas, anabatistas, metodistas, pentecostais, etc., que não vale a pena enumerar todas. Não quero falar do fundador, Lutero, que, primeiro frade agostiniano, depois de egresso se juntou com uma freira, também egressa – cada qual com seu igual. Não quero referir-me à sua vida particular, para que ninguém pense que eu tencione rebaixá-lo e com ele os protestantes, embora isto possa servir de argumento. Pois se Deus o tivesse chamado para restabelecer a verdadeira doutrina da Igreja, como dizem os protestantes, conviria a escolha de um homem santo e não de um frade apostata, perjuro, amasiado, revolucionário, etc. — Calemo-nos, pois, de Lutero e contentemo-nos com o exame da doutrina protestante, confrontando-a com a doutrina católica. Para irmos ao âmago da questão, inquiramos logo: qual a questão fundamental entre o catolicismo e o protestantismo? Muitos autores tratam questão por questão e escrevem grandes volumes. Isto, geralmente, é muito bom, mas nem todos têm o tempo disponível para ler e estudar tudo, e, não obstante, querem ter ideia exata, baseada em argumentos sólidos, irrefutáveis e evidentes. É para estes que escrevo. Já provei nos primeiros três capítulos que a Igreja Católica, é a única verdadeira Igreja de Cristo. No capitulo presente resta-me mostrar que o fundamento sobre o qual foi construído o edifício protestante está errado e, por conseguinte, errada toda a doutrina protestante, em quanto difere da doutrina católica.
Lutero protestou contra a autoridade do Papa na explicação da religião. Para maior clareza, lembre-se o leitor da doutrina católica, explantada nos capítulos passados: Jesus ensinou os apóstolos e mandou-os pregar a sua doutrina a todo o mundo:
«Ide e ensinai todos os povos, etc.»
Obrigou o mundo todo a aceitar a doutrina dos apóstolos, dizendo por cima:
«Quem crê, será salvo, quem não crê, será condenado»
Jesus prometeu ficar com os seus apóstolos até ao fim do mundo:
«e eis que estarei convosco, etc.»
Mandou o Divino Espírito Santo:
«e eu rogarei ao Pai que vos mandará outro Consolador, o Espírito da verdade, etc.»
Acrescentou:
«Assim como meu Pai me enviou, eu vos envio: quem vos ouve, a mim me ouve, quem vos despreza, a mim despreza e quem a mim despreza, despreza aquele que me enviou.» (Luc. 10, 16)
Estes e outros textos provam a autoridade da Igreja, para ensinar a doutrina revelada por Jesus Cristo. Só a ela cabe a última palavra em questão de fé e de moral. E conforme as palavras claríssimas de Jesus, à sua ordem categórica, todos nós temos que ouvir a Igreja e aceitar a sua decisão, cada vez que haja alguma dúvida sobre artigos de fé. Assim a Igreja procedeu durante todos séculos, ainda o faz e continuará a fazer até ao fim do mundo. Nestas suas decisões ela é assistida pelo divino Espírito Santo, e por Jesus mesmo, como Ele garantiu. É preservada do erro, para que todos os fiéis com certeza tranquilamente possam crer o que ela ensina. Se Jesus não tivesse ficado com a sua Igreja, teria faltado à sua palavra, à sua promessa. Quem então nos garantiria ainda a verdade de sua doutrina após tantos séculos? Neste caso Jesus não seria o Filho de Deus, mas um impostor, e toda a religião um logro infernal.
Isto, porém, não pode ser: Jesus se legitimou por muitos meios: pela doutrina, o cumprimento das profecias, a vida santa, por milagres estupendos e pela continuação de sua Igreja. Por isto, o divino Espirito Santo e Jesus protegem a Igreja contra todo erro no terreno da fé e da moral.
Lutero protestou contra esta autoridade da Igreja. Segundo ele, toda a doutrina está na Bíblia, e cada um deve haurir da Bíblia a verdadeira doutrina. — Substituiu, pois, a autoridade da Igreja pelo juízo individual. Rejeitou a autoridade da Igreja, protestando contra ela; daí o nome de protestantismo. Cada um – diz ele – deve achar a verdade na Bíblia. Os protestantes o fizeram. Aceitaram como única fonte de fé revelada a Bíblia, explicada pela razão individual de cada um.
Qual o resultado? Lisonjeou muito a soberba humana, favoreceu mais ainda certos vícios, em pouco tempo cada um seguia a sua própria cabeça. Cada qual achou na Bíblia o que lhe agradava. Acabou entre eles a unidade de fé e de sacramentos. Os anglicanos queriam continuar com a Santa Missa, os cutros rejeitaram-na. Cada um era o seu próprio chefe, naturalmente – segundo eles diziam – assistido do Espírito Santo. Em pouco tempo o protestantismo se subdividiu espantosamente. Faltou-lhe a necessária certeza na fé, o que é proveniente do próprio sistema: a razão humana é sujeita ao erro. Sabemo-lo por própria experiencia.
Já os romanos diziam: errare humanum est. Por conseguinte, a explicação da Bíblia ficava sujeita à razão humana, e por isto ao erro, ao engano. Assim, esta parte da religião perdeu seu cunho divino. O que um aceitava como revelado, outro entendia de outro modo, até o contrário e assim por diante, até que enfim…: sim, senhores, até que a Bíblia toda perdesse para eles o seu valor divino. A Bíblia, sem a autoridade do Papa, fica sem autoridade revelada. Jesus não deixou escrita nenhuma palavra. A maior parte dos apóstolos também não escreveu. Dois evangelhos são de discípulos dos apóstolos. A Bíblia do Novo Testamento consiste só de fragmentos de cartas, propriamente falando, particulares, isto é, escritas para fins particulares, dos atos dos apóstolos e de um compêndio de profecias obscuras, que custa muitíssimo entender.
Tudo isto estava espalhado e misturado em cartas apócrifas. Quem podia garantir que uma carta ou um evangelho eram escritos com assistência divina? Tanto mais quanto dois evangelhos não foram escritos por apóstolos.
O cristianismo já existia há séculos, e a Bíblia ainda não era joeirada, isto é, não se determinara ainda o Cânon dos livros inspirados.
Só após quatro séculos, o Papa mandou examinar os escritos e separar as obras legítimas, e assim nasceu o conjunto da Bíblia do Novo Testamento. Mas com que autoridade? Quem nos garante a divina inspiração desta Bíblia, tal qual hoje a temos? Por que não foram aceitas outras cartas e escritos? Talvez alguém responda que há provas para a autenticidade dos livros reconhecidos, por exemplo: pelo evangelho de São João temos Policarpo, discípulo de São João; e Irineu, bispo de Lyon, que foi discípulo de Policarpo, escreveu sobre o evangelho que São João compôs. Depois temos Justino e também Santo Inácio, bispo de Antioquia, que só poucos anos após São João morreu em Roma. Replico: Pois não, concedo a São João a autoria do quarto evangelho, mas isto não é a questão: a questão é saber quem me garante que este livro foi escrito sob a influência divina, que é a palavra revelada por Jesus Cristo? De mais a mais só existiam ainda cópias: os manuscritos autógrafos já tinham deixado de existir, há muito tempo.
Quem me garante que tudo foi fielmente copiado? Daí, se não aceitarmos a autoridade do Papa, só nos resta dizer: adeus, Bíblia revelada! Ou aceitar a autoridade do Papa, transmitida por Jesus Cristo, e receber das mãos desta autoridade a Bíblia como livro escrito com a assistência divina, ou renunciar à autoridade da Bíblia como palavra revelada de Deus. Outro caminho não há.
Os protestantes, porém, rejeitam a autoridade do Papa, assim como a tradição: consequentemente devem também rejeitar a Bíblia como livro revelado.
Sem o Papa, não têm e nunca poderão achar prova alguma da origem divina da Bíblia, e, por conseguinte, das verdades que ela contém.
A doutrina católica é inteiramente outra. Nós, católicos, aceitamos inspiração divina da Bíblia e com isto toda a sua autoridade divina, mas não só a Bíblia: antes e em primeiro lugar aceitamos a TRADIÇÃO, que contém toda a doutrina e que desde os tempos dos apóstolos foi comunicada oralmente por toda parte. Temos como axioma: o que por toda parte foi ensinado e aceito como revelado por Deus sobre a religião dentro da Igreja, é genuinamente católico.
Se, no decurso dos séculos, houve alguma dificuldade, recorria-se ao sucessor de São Pedro, ao Papa de Roma, que decidia a questão, declarando o que foi revelado e o que não o foi – Roma locuta, causa finita, depois de Roma ter falado, acabou-se a questão. — Desta tradição uma grande parte foi escrita sob a inspiração divina e este livro nós chamamos Bíblia.
A Tradição é o fundamento: pela Tradição sabemos que São Pedro foi designado e instituído chefe da Igreja – o que também depois foi escrito na Bíblia. – Pela Tradição sabemos que São Pedro morreu em Roma – verdade confirmada pela história eclesiástica e profana, mas que não está na Bíblia, embora seja uma das principais questões; – pela Tradição e não pela Bíblia sabemos que devemos santificar os domingos e não os sábados, etc. A Tradição abrange tudo; a Biblia, uma grande parte do todo.
O centro do catolicismo, pois, é o sucessor infalível de São Pedro ou o Papa de Roma. Sem o Papa, a Igreja já não existiria, teríamos a mesma mixórdia dos protestantes, ou pior; sem o Papa, adeus unidade de fé, dos sacramentos, do sacrifício, de tudo!
Protestantes eruditos sabem perfeitamente o que acabo de escrever.
Justamente por isto, os mais eruditos entre eles não falam mais contra o catolicismo. Muitos até se convertem.
Outros há que rejeitam o cristianismo, pois se quisessem continuar a ser cristãos, deveriam ficar católicos e isto lhes custa demais. Preferem seguir o ceticismo, um certo agnosticismo.
Isto para os eruditos. Para os que os estão a par da ciência ou para os ignorantes na matéria, ainda serve o materialismo, que cientificamente está inteiramente derrubado e teve que fugir de todas as universidades dignas deste nome.
Só os ignorantes, portanto, ainda podem ser protestantes.
Num país culto, como, por exemplo, a Alemanha, não há mais de vinte por cento de protestantes desta ou daquela denominação de seita, que ainda acreditem num Deus pessoal, criador do céu e da terra.
Entre os protestantes alemães não haverá mais cinco por cento que ainda creem na divindade de Jesus, e assim está acabando o protestantismo genuíno da Alemanha, onde nasceu.
Vejam outro país: a Holanda. Este povo, que parece mais conservador, vai pelo mesmo caminho. Muitos há que ainda se chamam protestantes por costume, ou porque os pais assim se chamavam, mas os crentes na Bíblia, na divindade de Jesus, estão diminuindo cada vez mais.
O protestantismo não resiste à crítica, à ciência histórica, à lógica: não tem base cientifica.
Um povo erudito, como é o alemão, não pode aceitar incongruências, sistemas sem fundamento provado e por isso rejeita o protestantismo.
O que na Alemanha fica de pé, são o catolicismo e o judaísmo.
A América do Norte em geral é ainda menos culta que a Alemanha, mas também lá começa a mesma tendência. Nem sequer a metade dos protestantes manda batizar as crianças. Lá a religião é muitas vezes um artigo de moda e por isto variável como a própria moda. Outras vezes serve de reclame para negócio.
Mas também ainda há gente religiosa entre os protestantes, que tanto mais se agarra à sua seita e ajunta até dinheiro para propaganda em países, que eles julgam menos civilizados. As igrejas protestantes, na América do Norte, porém, com isto se enchem? Pelo contrário, ficam cada vez mais vazias, sempre mais desprezadas. É para ter dó daqueles coitados, que querem o bem, a religião, e devem ver como a sua religião é mais e mais desprezada, justamente pela parte erudita dos protestantes. Veem como floresce o catolicismo, como este sempre mais se ergue, se propaga, sempre mais é presado justamente dos mais eruditos, também dos próprios protestantes: este catolicismo que aprenderam a odiar e de que têm ideias tão errôneas e contraditórias. Do seu lado, no protestantismo, só observam desânimo, discórdia, dissidência, a morte lenta e, por cúmulo da desgraça, o desprezo do mundo científico, partindo este desprezo das próprias fileiras dos homens eruditos que nasceram no protestantismo, e que pelo estudo se viram obrigados a deixá-lo. Começou com um grande homem, a que dão o nome de filósofo: Emanuel Kant. Este ainda conservou durante algum tempo como postulado da razão prática — embona contra a ciência do seu criticismo — uma espécie de religião. Mais tarde, porém, na sua idade mais avançada, também ele deixou esse postulado da razão prática inventado por ele mesmo. E notemos bem que nunca se ouviu que Emanuel Kant tenha manifestado aversão ou antipatia contra o protestantismo. Isto mesmo observamos hoje entre os protestantes eruditos da Alemanha, Holanda, etc. Eles não odeiam, não perseguem o cristianismo protestante; pelo contrário, queriam muito, que a sua religião vencesse o catolicismo e é com mágoa que são testemunhas da vitória científica do catolicismo.
Quem, por exemplo, há cem anos, no Norte da Europa estudava a filosofia de Aristóteles, Santo Agostinho, Santo Tomás, Dum Scoto, etc.?
E hoje? Hoje por toda a parte esta filosofia, que é a católica, está avançando, alcança vitória sobre vitória, sempre conquista mais adeptos: venceu o materialismo e está vencendo o ceticismo. Os próprios protestantes o reconheceram, já há muito tempo. Foram eles mesmos que concederam o premio Nobel de filosofia ao Cardeal Mercier, foram e são eles mesmos que convidam, por exemplo, na universidade de Amsterdam filósofos católicos para ensinar a filosofia católica. Já se nomeiam frades e padres para lentes catedráticos nas universidades protestantes, por exemplo: Utrecht e outras.
Estamos, pois, diante do dilema: ou aceitar o Papa de Roma como chefe da Igreja, sucessor legítimo de São Pedro, investido com toda a autoridade por Jesus mesmo, ou negar toda a nossa fé cristã. O meio caminho do protestantismo só serve para embair os retrógrados. Nunca satisfará a um homem que está a par da ciência religiosa.
Recomendação de leitura para complementar esta breve obra:
A Igreja Católica de Mons. Tihamer Tóth
Índice Bíblico contra acusações Protestantes, do Pe. Matos Soares