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História da Igreja 6ª Época: Capítulo IV

Eleição de Pio IX

Um dos maiores pontificados e dos mais esplêndidos, é sem dúvida alguma o de Pio IX. Nasceu em Sinigaglia no ano de 1792, da família dos condes Mastai Ferretti e se chamou João Maria. Jovem ainda, tinha ido a Roma para alistar-se no exército pontifício; porém sua abalada saúde impediu-lhe a realização de seu desígnio. Mas Deus que o chama para grandes coisas, o curou como temos visto, para que pudesse alistar-se na milícia sacerdotal. Desde jovem já brilhava em João todo gênero de virtudes; a devoção à Bem-aventurada Virgem formava todas as suas delícias. Digno ministro de Jesus Cristo prontamente conheceu a grande necessidade que tem a juventude de ser educada; e para este fim consagrou os primeiros trabalhos de seu grande ministério. Tomou conta em Roma da direção e administração de dois grandes institutos, conhecido um sob o nome de Tata Giovanni e outro de São Miguel em Ripagrande, onde se albergam centenas de meninos pobres. Uma difícil missão levada a cabo no Chile por comissão de Pio VIII demonstrou o grande talento e a rara habilidade que possuía no manejo dos grandes negócios. À sua volta do Chile foi nomeado bispo, e finalmente no ano 1840 criado cardeal. A morte de Gregório foi, quase, por unanimidade de votos, proclamado pontífice a 16 de junho de 1846 dois dias depois de terem entrado para o conclave os Cardeais, e tomou o nome de Pio IX. Para narrar devidamente os feitos deste incomparável pontífice seriam necessários muitos e avultados volumes; limitaremo-nos, pois, a indicar alguns.

Anistia e Aplausos

Assinalou Pio IX sua eleição com um ato de clemência por meio de uma anistia, isto é, de um perdão geral, a todos os que durante o pontificado de Gregório XVI se tinham tornado culpados de rebelião contra o estado. As­sim, pois, muitos desterrados e muitos presos puderam livremente voltar ao seio de suas famílias. Introduziu igualmente algumas reformas no governo civil de seus Estados. Estes atos de clemência fizeram ressoar seu nome em todas as partes acompanhado de um sem número de aplausos. Alegravam-se os bons com aqueles sinais de obséquio ao supremo pastor da Igreja, porém os malvados guiados pela estranha ideia de formar uma Jovem Itália, ou o que é o mesmo, uma república italiana, aproveitaram-se daqueles mesmos favores em seu prejuízo. Muitos dos que já tinham perturbado a paz em outros países, foram a Roma e sob o pretexto de unir seus aplausos aos que todo o mundo tributava ao grande Pio IX, faziam o possível para induzi-lo a declarar guerra à Áustria. Sendo o Papa pai espiritual de todos os fiéis, nunca poderá resolver-se a declarar guerra, senão em defesa da religião ou de seu povo; porque os soberanos e os povos, a quaisquer pais que pertençam são sempre seus filhos.

“Saiba o mundo que nós amamos a independência da Itália, porém nunca nos deixaremos levar a uma declaração de guerra ou a derramar sangue para consegui-la”

Fez, pois, o Papa tudo o que convinha a seu ofício de pai.

Revolução em Roma

Em vista disto, os autores dos aplausos, os que tinham levantado estrondosos vivas, começaram por pedir reformas, logo outro governo, e em seguida a dar gritos de morte ao soberano da cidade eterna. O Santo Padre para tentar um último remédio, outorgou favores e chamou a Roma o conde Pellegrino Rossi, hábil político, e nomeou-o presidente de seus ministros, recomendando-lhe que se esforçasse para conservar a ordem de paz. Inútil remédio. O conde Rossi foi assassinado, entre espantosos gritos, no mesmo momento que ia entrar no palácio da Chancelaria, onde se achava então a Câmara dos deputados, desarmam os guardas do Quirinal, apunhalam a um sacerdote chamado Ximenes, e um tiro de pistola faz cair morto a monsenhor Palma, secretário de Pio IX. assim, pois, viu o Papa derramar-se o sangue de seus familiares nas salas de seu próprio palácio, e sua pessoa em perigo de cair em mãos daqueles revolucionários, a quem não espantava delito algum. Vendo, pois, o pontífice desconhecida a independência de sua autoridade, ameaçada sua vida, mal seguros os cardeais e os empregados públicos que permaneciam fiéis à sua pessoa, tomou a resolução de fugir. Mas como subtrair-se a seus inimigos que guardavam todas as saídas do Quirinal? Deus assiste a seu vigário e não abandona sua causa, que é a da Igreja.

Pio IX em Gaeta

Ajoelha-se Pio IX diante de um crucifixo e reza; em seguida se levanta veste-se à secular e confia sua salvação à divina Providência. Já noite, acompanhado por um só criado, desce a um porão e por uma espécie de subterrâneo, se dirige a um lugar determinado onde o esperava o conde Spauer, ministro da Baviera. Sobe com ele ao coche e fazendo correr os cavalos chegam felizmente a Gaeta, antes de saberem de sua fuga. Tinham-no já precedido nessa cidade, o cardeal Antonelli e outros prelados que o esperavam. Quando correu a notícia de que o Papa se achava em Gaeta, tornou-se es­ta cidade, qual nova Roma, centro da Religião, e para ali se dirigiram os fiéis de todo o mundo. Ditoso o rei de Nápoles, por abrigar a semelhante hóspede, lhe prodigalizou toda espécie de cuidados, e não poupou meios para prover de todo o necessário ao Papa e aos que o acompanhavam. Ficou Pio IX dezesseis meses em Gaeta, não se descuidando do bem Universal da Igreja. Deu entre outras coisas, solene prova de veneração para com a Mãe do Salvador, dirigindo uma carta aos bispos de todo o mundo, em que os convidava, para que unidos com seus fiéis, pedissem e manifestassem seu modo de pensar sobre a Conceição Imaculada da Santíssima Virgem, de que logo falaremos.

O chefe da religião, despojado assim de seus estados, e obrigado a fugir com tanta precipitação de sua sede, achava-se em verdadeiras angústias para prover a si e aos seus, e ter correspondência com todo o mundo. Em vista disto, os católicos, com afeto de filhos, procuraram o melhor meio para acudir em socorro de seu pai, já com grandes, já com pequenas somas de dinheiro a que chamaram como nos antigos tempos, óbulo, ou dinheiro de São Pedro, porque tem por fim socorrer ao chefe da religião e sucessor daquele santo apóstolo no governo da Igreja. O óbulo de São Pedro é ainda o meio com que hoje se provê às grandes estreitezas do chefe supremo da Igreja.

República em Roma

Quando se soube em Roma da fuga do Papa, uma dor imensa feriu o coração de todos os bons. Mas os inimigos da ordem, acreditando que tinha chegado ao apogeu da fortuna, reuniram-se e por um ato sacrílego, constituíram em Roma uma República, dirigida por um triunvirato, isto é, por três chefes: Mazzini, Armellini e Saffi. Estes declararam o Papa privado de todo o poder soberano, e se constituíram árbitros de toda autoridade. O primeiro ato de seu governo foi impor tributos, por em circulação uma quantidade imensa de papel moeda, e se apropriar de uma grande parte dos bens da Igreja. Sinos da igreja, cálices, píxides, custódias, turíbulos, e todos os objetos de ouro e prata, foram roubados para com eles fazer dinheiro. Vários sacerdotes religiosos foram assassinados; doze deles morreram em um só dia debaixo dos golpes de punhal. Mosteiros e conventos foram violados e profanados, e não curto número de sagrados ministros barbaramente estrangulados. Corramos porém um véu sobre tanta iniquidade.

Roma Livre

O céu não podia permitir que se continuassem a cometer impunemente tantas iniquidades. As potências católicas, quais carinhosos filhos resolveram acudir em socorro do pai comum, cuja Sé de natural está em Roma. Espanha, Nápoles, Áustria, Baviera e França põem-se de acordo para libertar Roma; e enquanto a Áustria conserva a autoridade do Papa na parte principal dos Estados pontifícios, a França, ainda que república, encarrega-se de expulsar de Roma aqueles rebeldes. Com este fim uma companhia de valorosos franceses marchou diretamente sobre Roma, que teriam podido tomar mais prontamente do que o fizeram, se tivessem querido por em obra todos os meios violentos de que podiam dispor; porém como quisessem salvar da destruição os monumentos preciosos da cidade, e mais ainda, evitar o derramamento de sangue, em quanto lhes fosse possível, empregaram três meses em apoderar-se dela. Os sitiados levaram a cabo proezas dignas de melhor causa. Encarniçadas lutas; conquista e reconquista de uma mesma posição por ambas as partes, sem nenhuma dar-se por vencida antes de sucumbir. Finalmente, a 29 de junho, dia dedicado ao príncipe dos apóstolos, fizeram os franceses tão forte assalto à cidade, que rechaçados os inimigos, ficou Roma em seu poder. É fácil imaginar qual a alegria dos Romanos, quando se viram livres daqueles revolucionários e puderam novamente gozar de paz e tranquilidade, dedicar­-se ao comércio, tornar a abrir os conventos, as igrejas, e praticar de novo pacificamente sua religião.

Volta de Pio IX

A notícia da libertação de Roma chegou logo aos ouvidos do Sumo Pontífice, que profundamente comovido exclamou:

“Deus seja bendito, agora cessa o derramamento de sangue entre meus filhos”

Muitos desejavam que voltasse imediatamente para Roma; porém as pessoas prudentes aconselhavam-no que protelasse sua volta. Esta não se verificou até o dia 12 de abril de 1850. Houve naquele dia tal concurso de povo, tais transportes de alegria, que talvez não se visse coisa igual desde que Pio VII entrou de novo em Roma depois de sua prisão. O afortunado Pontífice dirigiu-se antes de tudo à basílica de São Pedro para dar graças a Deus pela paz dada à Igreja, em seguida, com aquele zelo e carinho que lhe eram próprios, começou a cicatrizar as profundas chagas causadas pelos repuplicanos à Religião e ao Estado.