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O que Jesus Cristo sofreu dos Seus Apóstolos

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Meditação para a Segunda-feira Santa

SUMARIO

Meditaremos sobre o que Jesus Cristo sofreu dos Seus Apóstolos na Sua Paixão, a saber:

1.° De Judas, que O traiu;

2.° De São Pedro, que O negou;

3.° Dos outros Apóstolos, que O abandonaram.

— Tomaremos depois a resolução:

1.° De não nos fiarmos em nós mesmos e de confiarmos só em Deus;

2.° Se suportarmos com paciência todos os desgostos que nos dão as criaturas, até os nossos melhores amigos.

O nosso ramalhete espiritual será a queixa de Jó aplicada a Nosso Senhor:

“Os meus propínquos me desampararam” – Derelinquerunt me propinqui mei (Jó 19, 14)

Meditação para o Dia

Adoremos Jesus Cristo tão cheio de amor para com os Seus Apóstolos, tão indulgente para com os seus defeitos, tão generoso nos favores que lhes liberaliza, e não obstante isto, traído, negado, abandonado por eles. Adoremos a Sua misericórdia, louvemos e bendigamos a Sua indulgência para com as fraquezas humanas.

PRIMEIRO PONTO

Jesus traído por Judas

Nosso Senhor tinha enchido Judas de benefícios; tinha-o feito Seu Apostolo e amigo, honrado com o dom dos milagres. Na última Ceia, havia-lhe lavado os pés, tinha-se-lhe dado todo pela comunhão; e eis que em vez de reconhecer tantos favores, esse desgraçado o vende aos judeus por trinta dinheiros, caminha na frente de seus inimigos, que vêm prendê-lO, e dá-Lhe o pérfido ósculo, sinal convencionado para o designar aos soldados. Oh! Quão dolorosa foi esta traição para o coração de Jesus! Se é penoso, quando se ama, não poder ser correspondido, que será não recebendo em retribuição desse amor senão perfídia e malícia? Nosso Senhor quis sofrer esta dor para consolar aqueles que a ingratidão ou a perfídia prova, e lhes ensinar como devem portar-se nestas circunstâncias. Opõe à traição a bondade e a doçura.

Amigo, diz Ele a Judas (1). Era dizer-lhe: Ainda que já me não amas, eu amo-te sempre, e estou tão pronto a perdoar-te como a receber a injúria que me fizeste sem motivo; e era dizer a nós mesmos que nunca nos enfademos com aqueles de quem temos mais razão de queixar-nos, que nos condoamos antes do que nos indignemos de quem peca, e nunca deixemos de confiar na divina misericórdia, pois que Jesus Cristo conserva o nome de amigo ao próprio Judas, depois do seu crime.

A que vieste? Acrescenta o Salvador (2). Que significações têm estas palavras! A que vieste, Judas? Para receber trinta dinheiros e a maldição de Deus, para ter um pequeno lucro temporal e a condenação eterna! Que demência! Para que são, ó alma cristã, esses cuidados, esses empenhos em satisfazer a soberba, a ambição, a cobiça? Que te provém daí? Para que essa frouxidão no serviço de Deus, essa tibieza na oração, esse tempo perdido em conversações inúteis, em leituras frívolas? Que te provirá daí? Para que toda a tua vida? Para que cada uma das tuas ações? Qual é o fim delas? Qual o seu fruto? (3) Oh! Que insensato é o homem que peca, que se propõe outro fim que não seja Deus, quer no que faz, quer no que projeta!

SEGUNDO PONTO

Jesus Cristo negado por São Pedro

Deixemos ao silêncio da oração dizer-nos qual foi, nesta ocasião, a dor que sentiu Jesus, e meditemos sobre os ensinos tão úteis que nos oferecem o pecado e a conversão do Apóstolo. O seu pecado ensina-nos:

1.º A não nos fiarmos em nós mesmos. São Pedro pecou, porque presumiu das suas forças; e sucederá o mesmo a todos os presunçosos que confiam na sua virtude.

2.° A não nos separarmos de Jesus Cristo, com uma demasiada frequentação da sociedade ou com a distração. São Pedro só seguia o Salvador de longe, diz o Evangelho (4).

3.º A fugirmos das ocasiões. São Pedro deteve-se a falar com as criadas.

4.° A precatarmo-nos com a vigilância e a oração. Jesus Cristo tinha recomendado estes dois meios (5). São Pedro havia dormido no horto das Oliveiras.

5.° A levantarmo-nos logo depois da primeira queda; sem o que se cai de abismo em abismo. São Pedro na primeira tentação tinha dito: “Não conheço tal homem” (Mt 26, 72) na segunda tinha confirmado com juramento estas desgraçadas palavras; na terceira havia confirmado este juramento com imprecações (6). Assim se cai de pecado em pecado quando se demora a conversão.

A conversão de São Pedro ensina-nos:

1.º Quanto Nosso Senhor é bom: com um olhar penetra o coração de Seu Apóstolo e o converte. Ó olhar proveniente! Pedro não busca Jesus; é Jesus que dá os primeiros passos. Poderoso olhar! Ele reanima Pedro, e lhe faz derramar uma torrente de lágrimas. Olhar cheio de doçura! Evita a Pedro a vergonha de seu crime, e sara a ulcera sem a tocar. Olhar generoso! Jesus esquece as Suas próprias dores para se ocupar na conversão de seu Apóstolo, e congraça-se com o Seu servo depois que ele O ultrajou. Feliz aquele que, compreendendo o poder deste divino olhar, sabe expor-lhe as suas feridas e abrir-lhe o seu coração.

2.° A deplorar os nossos pecados, não por medo, mas por amor; a deplorá-los amargamente (7), a deplorá-los sempre. Pedro deplorou até morrer a desgraça de ter negado o seu Mestre; e enquanto viveu, as suas faces conservaram o vestígio das copiosas lágrimas que corriam dos seus olhos.

Guardemos no fundo do nosso coração todos os ensinos que oferecem o pecado e a conversão do Apóstolo e aproveitemo-nos deles.

TERCEIRO PONTO

Jesus abandonado de todos os Seus Apóstolos

Os Apóstolos, que tinham feito tantos protestos de morrer por Jesus Cristo, perderam o ânimo diante do perigo, e todos o abandonaram. Aprendamos daí:

1.º Quão fraco e miserável de si é o homem, e quão pouca coisa é necessário para frustrar as nossas melhores resoluções; quanto, por conseguinte, devemos desconfiar das nossas forças, não contar conosco, não nos expormos às ocasiões; mas vigiar e orar incessantemente, para chamar em nosso auxilio a graça, que por si só pode fazer-nos viver bem.

2.° A não nos fiarmos nas amizades do mundo, ou a não nos deixarmos perturbar, quando nos falam. Os Apóstolos tinham prometido a Jesus Cristo que nunca O abandonariam e ao primeiro indício de perigo, fugiram todos. Se Jesus Cristo suportou este abandono, suportemos, a Seu exemplo, o abandono desses mesmos, com quem julgávamos ter mais direito de contar; contentemo-nos com Deus, que nunca nos desamparará: ficar-nos-á sempre, e Ele só basta.

Resoluções e ramalhete espiritual como acima

Referências:

(1) Amice (Mt 26, 50)

(2) Ad quid venisti? (Ibid)

(3) Ad quid? (Ibid)

(4) Sequebatur a longe (Mc 54)

(5) Vigilate et orate (Mt 26, 41)

(6) Caepit anathematizare et jurare (Mc 14, 71)

(7) Flevit amare (Mt 26, 75)

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(HAMON, Monsenhor André Jean Marie. Meditações para todos os dias do ano: Para uso dos Sacerdotes, Religiosos e dos Fiéis. Livraria Chardron, de Lélo & Irmão – Porto, 1904, Tomo II, p. 211-215)