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Respeito devido à Presença de Deus

Meditação para a Décima Nona Quarta-feira depois de Pentecostes

SUMARIO

Consideraremos o exercício da presença de Deus, não somente como uma pratica preciosa ao cristão, mas como um dever de religião; e para bem compreender este dever, veremos:

1.° Que somos obrigados a conservar-nos habitualmente na presença de Deus;

2.° Que somos obrigados a conservar-nos na presença de Deus com sumo respeito, tanto exterior como interior.

— Tomaremos depois a resolução:

1.° De respeitarmos em todo o lugar e tempo a presença de Deus, e de não fazermos diante dEle o que não ousaríamos fazer diante de uma pessoa venerável;

2.° De recitarmos muitas vezes atos de adoração de Deus presente.

O nosso ramalhete espiritual será a palavra de Jacó:

“Em verdade que o Senhor está neste lugar, e eu não o sabia” – Vere Dominus est in loco isto, et ego nesciebam (Gn 28, 16)

Meditação para o Dia

Adoremos Jesus Cristo ensinando-nos com o seu exemplo o respeito devido à presença de Deus. Desde o primeiro momento de sua Encarnação, a sua santíssima alma não o perdeu de vista um só instante; conservou-Se continuamente abismada no mais profundo respeito diante desta augusta majestade, e mereceu, com isto, que o Pai celestial nEle pusesse toda a sua complacência, como o revelou à terra (1). Quão digno dos nossos louvores e admiração é este respeito tributado à presença de Deus!

PRIMEIRO PONTO

Somos obrigados a conservar-nos habitualmente na presença de Deus

Que pensaríamos de quem, admitido à presença de um grande monarca, nenhum caso fizesse dele, procedesse e falasse como se esse monarca ali não estivesse? Seria sem dúvida um procedimento o mais ofensivo. Quão repreensível, pois, seria o procedimento do cristão que desprezasse a presença de Deus, diante de quem todos os monarcas da terra são menos que um grão de areia: que ousasse proceder como se ele nos não visse, falar como se não nos ouvisse, pensar como se não conhecesse os nossos mais secretos pensamentos; que lhe não declarasse os seus projetos, as suas resoluções e obras; que finalmente lhe não falasse senão de tempos a tempos, e até muitas vezes sem pensar no que lhe diz, e se portasse em todas as coisas com o desembaraço de quem esqueceu diante de quem está! Estou na presença de Deus! Esta só palavra deve impressionar-nos e conservar-nos abismados na mais profunda devoção: porquanto, que significa: Estou na presença de Deus!? significa que estou diante das suas perfeições divinas, que encantam todo o céu; diante das suas grandezas, que me impõem o maior respeito; diante da sua onipotência, que exige a minha profunda submissão; diante das suas inefáveis belezas, próprias para captar todos os corações; diante da sua bondade, que merece todo o meu amor; diante da sua misericórdia, que requer toda a minha confiança; diante da sua justiça, que devo temer; da sua santidade, que devo adorar, e da sua providência, em cujas mãos me devo entregar por toda a parte. E vivendo de dia e de noite no meio de tantos prodígios, que conservam os anjos numa eterna admiração, quão mal me ficaria não pensar nisto quase nunca, esquecer continuamente que estou nos braços do melhor dos pais, pai cheio de misericórdia, sempre pronto a perdoar as minhas culpas, quando lh’as confesso, a socorrer-me, quando a Ele recorro; sempre cuidadoso de mim, até contar os cabelos de minha cabeça (2), até velar à minha cabeceira enquanto durmo. Não me diz a minha consciência que repare em tão amável presença, que não incorra na expropriação que São João fez aos judeus:

“No meio de vós está quem vós não conheceis!?” – Medius autem vestrum stetit quem vos nescitis (Jo 1, 26)

“Ó meu Deus, iluminai os meus olhos para que eu veja!” – Domine… illumina oculos meos (Sl 12, 4). Domine, ut videam (Lc 18, 41)

SEGUNDO PONTO

Somos obrigados a conservar-nos na presença de Deus com sumo respeito, tanto exterior como interior

O respeito interior devido à presença de Deus consiste em um profundo abatimento de todas as faculdades da alma diante desta augusta majestade; em uma suave atenção em fazer bem tudo o que fazemos, ainda as ações mais ordinárias, comer e beber, conversar e dormir, em razão da santidade de Sua vista fixada sobre nós; finalmente, no sacrifício de todo o nosso ser, feito com alegria, e reiterado a cada ação com estas doces palavras, ou outras semelhantes: Tudo por vós, meu Deus! O exterior consiste em um aspecto sério e sempre modesto (3), a exemplo de São Francisco de Sales, tão grave e comedido quando estava só, como quando estava com alguém; em um modo de falar e de obrar sempre afável e caridoso, sempre digno, em que se revela uma alma convencida de que Deus a ouve e observa; finalmente, em uma moderação cristã, que faz e diz todas as coisas como convém, sem se apressar e se descuidar em coisa alguma, nem ainda nas recreações, que ela sabe tomar alegremente na ocasião oportuna, como um filho de Deus na presença de seu pai.

Resoluções e ramalhete espiritual como acima

Referências:

(1) Hic est Filius meus dilectus, in quo miohi complacui (Mt 3, 17)

(2) Capilli capitis vestri omnes numerati sunt (Lc 12, 7)

(3) Modestia vestra nota sit omnibus hominibus: Dominus prope est (Fl 4, 5)

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(HAMON, Monsenhor André Jean Marie. Meditações para todos os dias do ano: Para uso dos Sacerdotes, Religiosos e dos Fiéis. Livraria Chardron, de Lélo & Irmão – Porto, 1904, Tomo V, p. 74-77)