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História da Igreja 2ª Época: Capítulo IV

Santo Hilário

Contra os esforços que a heresia e a perseguição faziam em prejuízo da fé, suscitou Deus uma série de homens célebres pela santidade e doutrina, chamados comumente Doutores ou Mestres da Igreja. Estes pelo heroísmo de suas virtudes, pela profundidade de sua ciência e por zelo incansável, foram a salva-guarda do Evangelho em várias partes do mundo. Um destes bispos e doutores insígnes foi Santo Hilário de Poitiers, que com justiça se pode chama-lo apóstolo das Gálias, suscitado contra os arianos. Nascido de pais nobres, estes o instruíram em todos os ramos da literatura e das ciências e tanto aproveitou que ainda jovem, passava por um dos oradores mais eloquentes. Apenas conheceu a religião cristã, recebeu o batismo e começou a praticá-la com o exercício das mais sublimes virtudes. A extraordinária ciência e santidade que o adornavam foram motivo para que o nomeassem bispo de sua pátria; ele se opôs quanto pode, e somente aceitou o honroso cargo quando conheceu ser essa a vontade de Deus. A nova dignidade não produziu nele senão maior entusiasmo pela glória de Deus. Não poupou esforços ou fadigas para dar-se todo a todos e ganhá-los todos a Jesus Cristo. Sua casa foi a casa dos pobres; para eles era tudo o que possuía. Pregava com tamanho fervor a palavra de Deus, que os gentios e até os próprios arianos, em grande número naquelas regiões, corriam estupefatos a ele para que os instruísse nas verdades católicas.

O imperador Constâncio, grande protetor dos arianos, oprimia de mil modos os católicos, despojava-os de seus bens e os desterrava. Hilário, que se opôs, qual forte muralha, a esse perseguidor, chamou sobre si suas iras; por isso foi tirado de sua sede e desterrado para as mais longínquas regiões do Oriente. Hilário aproveitou essa ocasião para escrever vários livros em defesa do Evangelho. o mais importante e o que traz o título de Tratado da Trindade, composto expressamente para refutar os arianos. Nele se estabelece como regra infalível a doutrina de São Pedro, e falando dele assim se exprime:

“Oh! Feliz fundamento da Igreja e pedra digna de que sobre ela a Igreja seja edificada, para que quebre as portas do inferno e todos os vínculos da morte! ó bem-aventurado porteiro do paraíso, cuja sentença aqui na terra se transforma em juízo autorizado no céu; de modo que as coisas atadas ou desatadas sobre a terra recebem plena confirmação também no céu!”.

Achou-se também Santo Hilário no conciliábulo de Selêucia, que se reuniu no ano 359, convocado, por alguns bispos orientais infeccionados de arianismo. No meio de tantos inimigos da verdade, ele continuou em seu propósito de provar a divindade de Jesus Cristo refutando ponto por ponto a seus adversários; porém indignado por suas blasfêmias, abandonou aquele antro de Satanás e se apresentou ao imperador Constâncio, em Constantinopla, para lhe fazer patente o perigo em que se achava a fé ortodoxa, porém como o imperador era ariano e favorecia o concilábulo de Calcedônia, pediu Hilário permissão para disputar publicamente sobre a fé com seus adversários.

Os arianos receando ser confundidos publicamente pelo Santo, se recusaram a conferenciar com ele, dizendo que não queriam tratar com um perturbador da paz; e para sair do apuros, convenceram ao imperador que o fizesse voltar ao bispado de Poitiers. Sua entrada nas Gálias foi um verdadeiro triunfo, de todas as partes acorriam para festejá-lo, e o Senhor quis fazer mais ilustre sua volta, obrando milagres, como o de ressuscitar a um menino morto sem receber o batismo. Apenas gozou um momento de paz, se dedicou com o maior zelo a reparar a Igreja dos males que lhe tinham causado seus inimigos. também reuniu alguns Concílios, e tendo conseguido trazer para o caminho da verdade os bispos seduzidos pelos hereges, pode com sua cooperação desarraigar a heresia dos arianos, de quase toda a Gália. Escreveu muitos outros livros cheios de erudição, livros que São Jerônimo encarece e declara isento de todo erro. Morreu no ano 369.

Santo Eusébio

Santo Eusébio, bispo de Vercelli, foi o primeiro que reuniu no Ocidente os eclesiásticos da cidade, para viverem juntos na qualidade de religiosos, dando assim origem à instituição dos cônegos. Foi uma das principais salva-guardas da fé católica contra os arianos. Em um Concílio celebrado em Milão disputou com eles com tanta solidez de argumentação, que confundidos não sabendo que partido tomar, dirigiram-se ao imperador e conseguiram fazê-lo desterrar. O santo soube aproveitar o tempo de seu desterro para fortalecer os católicos do Oriente e Ocidente. Depois de ter sofrido fome, sede, açoites e outros ultrajes, tendo morrido o imperador Constâncio, permitiu-se-lhe voltar à sua diocese. A volta do magnânimo prelado, toda a Itália despiu-se das vestes de luto, lúgubres vestes, conforme a expressão de São Jerônimo, porque a volta de Santo Eusébio era o triunfo da verdade católica. Quis Deus dar­-lhe o prêmio que mereciam tantos padecimentos e fadigas, permitindo que depois de governar em paz sua diocese por alguns anos, recebesse a coroa do martírio das mãos de alguns arianos, que lhe deram a morte apedrejando-o. Subiu ao céu no ano 370.

Santo Ambrósio

Sem dúvida foi um dos bispos mais insígnes em doutrina e santidade, que floresceram na Igreja naqueles tempos. Achava-se presidindo em nome do imperador os negócios civis da Ligúria e da Emilia, porém como surgissem discórdias em Milão motivadas pela eleição do bispo, enviou-o o imperador para ali afim de apaziguar os ânimos.

“Ide, disse-lhe aquele monarca, e regulai as coisas não como severo governador, mas com a caridade de bispo.”

Ao chegar àquela cidade, entrou entre os amotinados e se esforçava em serenar os animos, quando um tenro menino que descansava nos braços da mãe, desprega a língua e grita:

“Ambrósio nosso bispo; Ambrósio nosso bispo.”

E tomando aquela voz como sinal da divina vontade, todos exclamaram:

“Ambrósio é nosso bispo.”

E assim, apesar de sua grande repugnância, com aplauso universal foi criado bispo de Milão no ano 374.

Escreveu muitos livros, sermões e cartas em defesa da religião e em favor da virgindade, da qual fez os maiores elogios, fundando em sua diocese vários conventos de virgens. Para conhecer qual a verdadeira crença entre todas as que se chamam cristãs, dava Santo Ambrósio esta regra:

Onde esta Pedro (vivendo em seu sucessor), ai está a Igreja de Jesus Cristo: Ubi Petrus, ibi Ecclesia.”

Significando com isto que são verdadeiros cristãos somente os que estão unidos com o sumo Pontífice. Este insígne Doutor descansou em paz no ano 397.

Segundo Concílio Ecumênico e os Macedonianos

O segundo Concílio Ecumênico é o primeiro Constantinopolitano, chamado assim porque foi o primeiro Concílio Ecumênico celebrado em Constantinopla. Motivou este Concílio a heresia de Macedônio, que, à força de enredos, se tinha elevado a fé daquela capital. Os arianos atacavam a divindade do Verbo; Macedônio, a do Espírito Santo. Era então imperador Teodósio o Grande, e regia a Igreja São Dámaso. Este douto Pontífice vendo ameaçada a fé, convocou, de acordo com o piedoso monarca, um Concílio em Constantinopla, para que se combatessem os erros ali onde tinham nascido. O Concílio se reuniu no mês de maio do ano 384, e concorreram a ele 150 bispos orientais. Foram condenados os erros de Macedonio e se confirmou o Símbolo de Niceia, ao qual se acrescentaram estas palavras que dizem respeito a divindade do Espírito Santo: Creio no Espírito Santo, Senhor e vivificador… o qual juntamente com a Pai e com o Filho e adorado e glorificado, o qual falou pelos profetas. Teodósio recebeu as decisões do Concílio como se fossem saídas da boca do próprio Deus e promulgou uma lei para que não fossem desprezadas. Ainda que não constasse esta reuniao senão de bispos orientais, bastou, sem dúvida, a aprovação do Papa para dar-lhe toda autoridade de um Concílio Ecumênico, de maneira que seus decretos constituem uma regra infalível de fé.

São Basílio Magno

São Basílio Magno nasceu no ano 319 em Cesaréia da Capadócia, de pais ilustres, nos quais a piedade pode se dizer foi hereditária. Seu pai também chamado Basílio (santo), sua mãe santa Emélia, e especialmente sua avó santa Macrina se encarregaram de educá-lo na ciência e na piedade. Jovem ainda, mandaram-no a um deserto; porém o bispo de Nazianzo prevendo que, por suas virtudes e profunda ciência, chegaria a ser um luminar da santa Igreja, o consagrou sacerdote apesar da sua repugnância. Tendo-se depois ocupado com grande zelo em pregar contra os arianos, trouxe muitos deles à fé. Manifestando-se sempre cada vez mais nele por meio dessas pregações, a santidade e a ciência, foi criado bispo ainda que tivesse fugido sempre dessa dignidade. Chamado à se episcopal de Constantinopla, empregou sua palavra e escritos em combater a heresia dos Macedonianos, e conseguiu reconduzir toda a cidade à fé católica. Isto provocou a inveja de muitos; então ele por amor à paz, renunciou ao bispado e se retirou para sua terra natal. Ali, em companhia de alguns solitádos, levou uma vida angélica. As mortificações, os jejuns, as vigílias, as orações, o silêncio e a solidão ocupavam todos os momentos de sua vida. Escreveu sobre muitos assuntos em prosa e em verso com admirável piedade e com tal elegância, que deixou muito aquém todos os seus contemporâneos. Finalmente, na idade de 60 anos, cheio de méritos, foi gozar a glória celeste. Ano 390.

São Dámaso

São Dámaso, espanhol, pontífice insígne por doutrina, prudência e virtude, tinha sucedido ao Papa Libério no ano 366. Deve-­se a ele a convocação de segundo Concílio Ecumênico. Edificou várias igrejas; entre elas a de São Lourenço em Roma; mandou que no fim dos salmos se acrescentasse o Gloria Patri; escreveu muitas obras em prosa e verso, e chamou a Roma São Jerônimo para que lhe servisse de secretário nas cartas latinas. Por ordem de São Dámaso, o grande doutor traduziu do hebraico para o latim os livros sagrados do Antigo Testamento, e corrigiu a tradução latina que já existia dos livros do Novo Testamento, fazendo-a mais conforme e fiel com o texto grego.

São Dámaso que o tinha estimulado com palavras e exemplos a fazer estas obras maravilhosas em favor da Igreja, morreu octogenário no ano 384, depois de dezoito anos de glorioso pontificado.

São Jerônimo

São Jerônimo nasceu na cidade de Estridon, na Dalmácia. Estudou em Roma, e depois de ter estado nas Gálias, foi a Constantinopla pôr-se sob a direção de São Gregório Na­zianzeno; dali passou ao deserto de Cálcida na Siria, onde levou uma vida muito austera, inteiramente dedicado ao estudo e à oração. Muito versado no grego, no latim e no hebreu, foi suscitado por Deus para interpretar e explicar as divinas Escrituras, e por isto o venera a Igreja de um modo especial, dando-lhe o título de Doutor Máximo. Sua tradução foi adotada pela Igreja, e é a mesma que, aprovada pelo Concílio de Trento, corre ainda em mãos dos Cristãos sob o nome de Vulgata. Quanto aos salmos, se usou sempre e ainda se continua usando a tradução latina do tempo dos Apostólos. Os hereges, tendo conhecido a profundidade de seu engenho, não pouparam meios para ganhá-lo; ele, porém, para certificar-se de não cair em erro, consultava com frequência a Santa Sé e com este fim escreveu diferentes cartas a São Dámaso. Entre estas é particularmente memorável aquela em que o santo doutor, cansado já pelo tédio que the causavam as diferentes facções que dividiam a igreja da Antioquia, dizia:

“Querendo me certificar de estar com Jesus Cristo, me uno a comunhão de Vossa Santidade, isto é, a cadeira de São Pedro; Eu sei que a Igreja está edificada sobre este fundamento; todo aquele que come do cordeiro fora desta casa é profano; todos os que não se refugiaram na arca de Noé, pereceram no dilúvio. Combato qualquer outra doutrina, porque quem não recolhe convosco, espalha, isto é, quem não está com Jesus Cristo está com o anti-Cristo.” (Ep. 14 ad Dam.).

Empregou toda a vida em compor livros para instruir os fiéis e combater os hereges; de sorte que, de todas as partes recorriam ,a ele nas questões mais difíceis. Escrevia com tal veemência contra os hereges que suas sentenças pareciam raios. Para evitar as insídias de seus inimigos e para preparar-se melhor para a morte, saiu de Roma e foi a Belém onde Santa Paula, dama romana, havia construído dois conventos; um para homens e outro para mulheres.

Ali consumido pela penitência e trabalhos, descansou no Senhor na idade de oitenta e nove anos. Ano 420.