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Filotéia

Filotéia

Nesta obra, São Francisco de Sales se dirige a Filoteia, que significa uma alma que "ama a Deus" e é para essas almas que escreve. O livro procura ajudar Filoteia a percorrer com resolução, empenho, confiança e ardor, o caminho da vida devota, apresentando-lhe doutrina eclesial as virtudes necessárias, as ciladas do inimigo e os benefícios da solidão.

Afetos que se devem seguir a este Exame

Parte V Capítulo VIII

Depois de reconheceres o teu estado, excita em tua alma estes afetos: Se fizeste algum progresso, por pouco que seja, agradece a Deus e reconhece que O deves unicamente a Sua misericórdia. Humilha-te diante de Deus, protestando que é por tua culpa que não tens adiantado mais, porque não correspondeste com fidelidade, ânimo e constância as suas inspirações, luzes e moções, quer na oração quer fora dela.

Exame sobre as Paixões

Parte V Capítulo VII

Demorei-me mais nos pontos antecedentes, que servem para conhecer os progressos feitos na vida espiritual; porque o exame dos pecados tem em mira a confissão daqueles que não aspiram a perfeição. Entretanto, é bom deter-se em cada um desses pontos, considerando o estado da alma e as faltas maiores que se poderão ter cometido. Mas, para resumir tudo, limitemos este exercício ao exame das paixões e consideremos unicamente o que temos sido e como nos temos comportado quanto aos pontos seguintes:

Exame do Estado da Alma para com o Próximo

Parte V Capítulo VI

Cumpre amar a um marido ou a uma esposa com um amor suave e tranquilo, firme e contínuo, e isso porque Deus assim o quer. O mesmo. digo dos filhos, dos parentes próximos e amigos, segundo o grau dos laços que nos unem. Mas, para falar em geral, quais são as disposições do teu coração para com o próximo? Amas sinceramente a todos por amor a Deus? Para o conheceres, relembra-te de algumas pessoas desagradáveis, enfadonhas e mal asseadas; é exatamente aqui onde se mostra o amor ao próximo, por Deus, ainda mais quando se tratam bem aqueles que nos ofenderam por suas ações ou palavras.

Exame do Estado da Alma para Consigo Mesma

Parte V Capítulo V

1. Que amor tens para contigo mesma? Não te amas demasiadamente com amor mundano? Se é assim, desejarás ficar muito tempo no mundo e terás cuidado de estabelecer-te aí; mas, se é para o céu que te amas, terás grande desejo de deixar esta terra; ao menos te conformarás facilmente a deixá-la, quando for a vontade de Deus. 2. É bem regrado este amor para contigo mesma? O amor desregrado é, pois, a nossa própria ruína. Ora, o amor regrado quer que amemos mais a alma que o corpo, que tenhamos mais cuidado de adquirir virtudes do que tudo o mais e que estimemos mais a glória eterna do que as honras mundanas e passageiras. Um coração regrado diz muitas vezes a si mesmo:

Que dirão os anjos, se penso nisto- ou naquilo?

E não dirá:

Que dirão os homens?

Exame do Estado da Alma para com Deus

Parte V Capítulo IV

1. Que diz o teu coração com respeito ao pecado mortal? Tens a firme resolução de não cometê-lo por nada neste mundo? Nisto consiste realmente o fundamento da vida espiritual. 2. Que diz o teu coração relativamente aos mandamentos de Deus? Ele os acha bons, suaves e agradáveis? Ah! Filotéia, quem tem o paladar e o estômago sadio gosta dos pratos bons e rejeita os maus. 3. Que diz o teu coração acerca do pecado venial? É impossível velarmos tanto sobre nós mesmos que não cometamos nenhum. Mas não há algum para o qual tenhas uma inclinação especial, ou, o que seria pior ainda, ao qual tenhas afeto?

Exame da Alma sobre o seu Adiantamento na Vida Devota

Parte V Capítulo III

O segundo ponto deste exercício é um tanto longo e por isso aconselho-te que o tomes por partes, por exemplo, tomando de uma vez o que concerne com teu procedimento para com Deus; o que diz respeito a ti mesmo, para outra; depois o que toca ao próximo e enfim a consideração das paixões. Não é necessário estar de joelhos senão ao princípio, para te apresentares a Deus, e no fim, para fazer os afetos. As outras partes deste exame, podes fazê-las com utilidade, mesmo na cama, se puderes estar aí algum tempo deitada sem adormecer; mas para isto é necessário que as tenhas lido atentamente. Cumpre que faças tudo o que concerne a este segundo ponto em três dias e duas noites no máximo, tomando cada dia e cada noite algumas horas para isto, conforme te for possível; pois, fazendo estes exercícios em ocasiões distantes uma da outra, eles já não farão as impressões que deverão produzir.

Consideração da bondade de Deus em nos chamar ao seu serviço, segundo as protestações feitas na primeira parte

Parte V Capítulo II

1. Considera os pontos dessa protestação. O primeiro é ter detestado, deixado e renunciado para sempre todo o pecado mortal. O segundo é ter consagrado tua alma, teu corpo, com todas as suas potencias e faculdades, ao serviço de Deus. O terceiro é que, se cometeres alguma falta, te levantes imediatamente. Não são estas resoluções louváveis, justas, generosas? Pensa, pois, quão razoável, santa e desejável é esta protestação. 2. Considera a quem fizeste esta protestação: a Deus. Se os compromissos tomados deliberadamente com os homens nos obrigam tão estritamente, quanto mais os que assumimos com Deus!

Ah! Senhor, dizia David, a ti foi que eu disse: Meu coração formou uma boa resolução, da qual nunca me esquecerei.

Necessidade de Renovar todos os Anos os Bons Propósitos

Parte V Capítulo I

O primeiro ponto deste exercício consiste em reconhecer bem a sua importância. A fragilidade e as más inclinações da carne, que agravam a alma e arrastam para as coisas da terra, nos fazem abandonar facilmente as nossas boas resoluções, a menos que, a força de as guardar, nos esforcemos muitas vezes para nos elevar aos bens celestes, como os pássaros, que, para não cair por terra, precisam bater continuamente com as asas no ar. Eis aí a razão, Filotéia, por que deves renovar assiduamente os bons propósitos de servir a Deus, com receio de que com o tempo recaias no primeiro estado ou, antes, noutro muito pior ainda, porque as quedas na vida espiritual nos colocam sempre muito abaixo ainda do que estávamos antes nas veredas da devoção.

Frisante exemplo para esclarecimento da matéria

Parte IV Capítulo XV

Para tornar mais evidente o que deixamos dito, vou narrar aqui um belíssimo passo da vida de São Bernardo assim como o li num autor tão sábio quão judicioso.
“É coisa comum, diz ele, a todos aqueles que começam a servir a Deus e que não tem ainda experiência das vicissitudes da vida espiritual, perderem logo todo o ânimo e caírem numa grande pusilanimidade, porque lhes faltam o gosto da devoção sensível e as iluminações agradáveis pelas quais corriam nas vias do Senhor”
E eis aqui a razão apresentada por aqueles que tem grande experiência na direção das almas. O homem não pode viver por muito tempo sem algum prazer ou desta terra ou do céu.

Securas e Esterilidades Espirituais

Parte IV Capítulo XIV

Esse tempo tão belo e agradável não durará muito, Filotéia; perderás tanto, às vezes, o gosto e o sentimento da devoção, que tua alma se parecerá com uma terra deserta e estéril, onde não verás nem um caminho, nem uma vereda para ir a Deus e onde as águas salutares da graça não correrão mais para a regar no tempo da seca, o que a tornará árida e desolará completamente. Ah! Bem digna de compaixão é a alma neste estado, sobretudo se o mal é violento; porque então ela se nutre de lágrimas, como David, dia e noite, enquanto o inimigo lhe diz por escárnio, para a levar ao desespero:

Ah! Miserável, onde está teu Deus? Por que caminho o poderás achar? Quem te poderá dar jamais as alegrias da graça?

Que farás, nesse tempo, Filotéia? Vai à fonte do mal. Muitas vezes essas esterilidades e securas se originam de nós mesmos.