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O pecador expulsa Deus do seu coração

Pecado (Renso Castaneda)

Tire o maior proveito desta Meditação seguindo os passos
para se fazer a Oração Mental proposta por Santo Afonso!

Qui dixerunt Deo: Recede a nobis, et scientiam viarum tuarum nolumus – “Disseram a Deus: Retira-te de nós, pois não queremos conhecer os teus caminhos” (Jó 21, 14)

Sumário. O pecador sabe que Deus não pode ficar com o pecado; vê que pecando obriga a Deus a afastar-se. Diz-Lhe portanto, não com palavras, mas de fato: Senhor, já não podeis ficar junto com o meu pecado e quereis partir, podeis ir-Vos embora. Expulsando assim Deus de sua alma, deixa entrar imediatamente o demônio, que dela toma posse. Que baixeza! Irmão meu, dize-me: praticaste tu também tão grande vilania para com Jesus Cristo?… Terás a triste coragem de a tornares a praticar no futuro?

I. Deus vem a morar numa alma que o ama; é o que Jesus Cristo mesmo nos assegura dizendo: “Se alguém me ama, guardará a minha palavra, e meu Pai o amará e viremos a ele e faremos nele morada: Ad eum veniemus, et mansionem apud eum faciemus” (1). Notemos as palavras: mansionem faciemus — “faremos morada”. Deus vem à alma a fim de nela permanecer sempre, de sorte que nunca a deixa, a não ser que a alma o faça sair, como diz o Concílio de Trento. — Mas, Senhor, Vós sabeis desde já que aquele ingrato Vos expulsará em qualquer momento: porque não partis agora? Quereis esperar que ele mesmo Vos expulse? Deixai-o e parti antes que ele Vos faça sofrer essa grande injúria. — Não, responde Deus, não quero retirar-me, enquanto ele mesmo não me repelir.

Assim, quando a alma consente no pecado, diz a Deus: Senhor, apartai-Vos de mim. Dixerunt Deo: recede a nobis (2). Não o diz vocalmente, mas de fato, como afirma São Gregório: Dicit: Recede, non verbis, sed moribus. — O pecador sabe antecipadamente que Deus não pode ficar com o pecado; vê que pecando obriga a Deus a afastar-se. É como se Lhe dissesse: Já que não podeis ficar junto com o meu pecado, já que quereis partir, podeis retirar-Vos. E expulsando Deus de sua alma, deixa entrar imediatamente o demônio, que dela toma posse. Pela mesma porta por onde sai Deus entra e vem estabelecer-se o seu inimigo: Et intrantes habitant ibi (3) — “Entrando habitam ali”.

Ao batizar-se uma criança, o padre ordena ao demônio: Sai desta alma, espírito imundo e sede o lugar ao Espírito Santo. Com efeito, aquela alma recebendo a graça converte-se em templo de Deus, como diz São Paulo (4). O contrário sucede inteiramente, quando o homem consente no pecado; então diz a Deus que reside em sua alma: Sai de mim, ó Senhor, e cede o lugar ao demônio. É disto exatamente que o Senhor se queixou a Santa Brígida, dizendo que é tratado pelos pecadores como um rei expulso de seu trono, no qual vai ser substituído por um salteador.

II. Não há mágoa mais sensível do que o ver-se pago com ingratidão por pessoas amadas e favorecidas. Consideremos portanto, como não deve ficar magoado o Coração sensibilíssimo de Jesus Cristo em ver-se posposto a um vil demônio e expulso brutalmente de uma alma pela qual derramou o seu preciosíssimo Sangue; tanto mais que semelhante baixeza se repete no mundo inteiro, em cada hora, milhares de vezes, especialmente nestes dias de carnaval.

— Meu irmão, tu ao menos compadece-te de teu aflito Senhor; dá-lhe desagravo por frequentes atos de amor e se no passado o tivesses magoado, pede-lhe humildemente perdão.

Assim, meu Redentor, todas as vezes que pequei, expulsei-Vos de minha alma e fiz tudo que Vos deveria tirar a vida, se ainda pudésseis morrer. Eu Vos ouço perguntar-me: Quid feci tibi, aut in quo contristavi te? responde mihi — Que mal te fiz, e em que te desagradei, para me causares tantos desgostos? — Perguntais-me, Senhor, que mal me fizestes? Destes-me o ser e morrestes por mim: é este o mal que me haveis feito. Que deverei, pois, responder? Confesso que mereço mil infernos; e é justo que a eles me condeneis. Lembrai-Vos, porém, do amor que Vos fez morrer por mim na cruz; lembrai-vos do sangue que por mim derramastes e tende piedade de mim.

Mas já o sei, não quereis que desespere; ou antes avisais-me de que Vos conservais à porta do meu coração, donde Vos bani e que nela estais batendo por meio das vossas inspirações, a fim de novamente entrar. Gritais-me que eu abra: Aperi mihi, soror mea (5).

Sim, meu Jesus, expulso o pecado; arrependo-me de todo o meu coração e amo-Vos sobre todas as coisas. Entrai, meu amor, está aberta a porta; entrai e nunca mais Vos afasteis de mim. Prendei-me com os laços do vosso amor e não consintais que me torne a separar de Vós. Não, meu Deus, não queremos mais separar-nos; abraço-Vos, aperto-Vos ao meu coração; dai-me a santa perseverança: Ne permittas me separari a te — “Não permitais que me separe de Vós”.

— Maria, minha Mãe, socorrei-me sempre, rogai a Jesus por mim; alcançai-me a felicidade de nunca mais perder a sua graça.

Referências:

(1) Jo 14, 23
(2) Jó 21, 14
(3) Mt 12, 45
(4) I Cor 3, 16
(5) Ct 5, 2

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(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo I: Desde o Primeiro Domingo do Advento até a Semana Santa Inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 285-287)