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Da Oração Dominical

Sic ergo vos orabitis : Pater noster, qui es in coelis, sanctificetur nomen tuum — “Assim, pois, é que haveis de orar: Pai nosso que estais nos céus, santificado seja o vosso nome” (Mt 6, 9)

Sumário. Nós somos tão ignorantes e curtos de juízo, que nem sabemos quais as graças que devemos pedir a Deus para nossa salvação. Jesus Cristo, vendo a nossa insuficiência, compôs a súplica que havemos de dirigir a nosso Pai celestial. Rezemos, pois, com frequência a oração sublime qual é o Pai nosso,e, como bons filhos, peçamos principalmente ao Senhor, que faça seu nome conhecido em toda a parte, que reine em nós pela sua graça e nos faça cumprir perfeitamente a sua santíssima vontade.

I. Consideremos como a Igreja militante, vendo-se composta de homens pecadores, se reconhece indigna de chamar a Deus seu Pai e de apresentar-lhe as sete súplicas que lhe dirige em nome dos fiéis na oração do Pai nosso. Eis porque na santa missa protesta pela boca do sacerdote, que lha dirige, porque assim lhe foi ordenado pelo próprio Deus. E deste modo nos ensina a fazer-lhe as sete petições do Pai nosso, nas quais consiste toda a nossa salvação, somente porque Ele assim o quer e ordena: Praeceptis salutaribus moniti… audemus dicere — “Instruídos com os vossos salutares preceitos… nos atrevemos a dizer”.

Nós somos tão ignorantes e curtos de juízo, que nem sequer sabemos quais as graças que havemos de pedir a Deus para nossa salvação. Pelo que Jesus Cristo, vendo a nossa incapacidade e insuficiência, compôs ele mesmo a súplica ou resumo das coisas que devemos pedir a Deus, e nos manda dizer: Pater noster qui es in coelis — “Pai nosso que estais nos céus”.

Escreve o Apóstolo São João: Videte qualem caritatem dedit nobis Pater, ut filii Dei nominemur et simus (2) — “Vede que amor nos mostrou o Pai em querer que sejamos chamados filhos de Deus e verdadeiramente o sejamos”. Foi um excesso de amor divino o querer que nós, vermes da terra, nos chamemos e sejamos filhos de Deus; não filhos por natureza, mas por adoção. Esta graça, como diz São Paulo, nos foi merecida pelo Filho de Deus ao fazer-se homem: Accepistis spiritum adoptionis filiorum, in quo clamamus: Abba (Pater) (3)— “Recebestes o espírito da adoção de filhos, no qual clamamos: Abba (Pai)”.

Que maior ventura pode esperar um vassalo, do que ser adotado como filho pelo rei? E uma criatura, do que ser adotada como filha pelo seu Criador? Pois, Jesus Cristo quer que com espírito filial façamos a Deus as petições contidas na Oração Dominical: Sic ergo vos orabitis: Pater noster, qui es in coelis — “Assim pois vós orareis: Pai nosso que estais nos céus”.

II. Sanctificetur nomen tuum — “Santificado seja o vosso nome”. Deus não pode ter santidade superior à que possui desde a eternidade, porquanto ela é infinita. Nesta petição não pedimos, portanto, senão que faça com que todos conheçam o seu nome, e todos os povos o amem: os infiéis que não o conhecem; os hereges que o conhecem mal; e os cristãos pecadores que o conhecem, mas não o amam.

Adveniat regnum tuum — “Venha a nós o vosso reino”. Há dois reinos em que Deus reina sobre as nossas almas: o reino da graça e o reino da glória. Ambos estes reinos são objeto desta petição. Pedimos primeiro que a graça divina reine sobre nós na presente vida, nos guie e nos governe, e em segundo lugar, que um dia sejamos dignos da glória, na bem-aventurança gozemos da posse de Deus e sejamos possuídos felizmente por Ele no paraíso.

Fiat voluntas tua, sicut in coelo et in terra — “Seja feita a vossa vontade assim na terra como no céu”. Toda a perfeição de uma alma consiste no cumprimento perfeito da vontade divina, como os bem-aventurados a cumprem no céu. Eis porque Jesus Cristo nos manda pedir que aqui na terra seja feita por nós a vontade de Deus, assim como no céu a fazem os santos. Ó Senhor, resigno-me em tudo à vossa Santíssima vontade; fazei-me sempre saber pela obediência o que de mim quereis, pois que quero cumpri-lo exatamente. Estou nas vossas mãos; fazei com que Vos ame sempre, e depois disponde de mim segundo a vossa vontade. Fazei o que julgardes mais próprio à vossa glória e à minha salvação eterna. Ó grande Mãe de Deus, Maria, obtende-me a santa perseverança.

Referências:
(1) Miss. Rom.
(2) 1 Jo 3, 1.
(3) Rm 8, 15.

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(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo I: Desde o primeiro Domingo do Advento até a Semana Santa inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 495-498)