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As Epístolas de Pedro e Judas

Lição 1: A 1Pd

1.1 A pessoa do Pedro

Simão, filho de João (Jo 1,42; 21,15-17; Mt 16,17) era, como seu irmão André, discípulo de João Batista (Jo 1,40s). Foi chamado pelo Senhor, que lhe impôs o nome de Cephas = Pedro (Jo 1,42). Durante toda a vida pública de Jesus, exerceu papel de destaque; cf. Mt 14,28-31; 17,24-27; Jo 6,67-69. A Pedro o Senhor prometeu e outorgou o primado entre os Apóstolos; cf. Mt 16,16-19; Lc 22,31s;Jo 21,15-17.

Após a Ascensão do Senhor, teve atividade primacial na escolha de Matias, no dia de Pentecostes, diante do sinédrio de Jerusalém, na recepção do pagão Cornélio na Igreja (cf. At 1 -5; 8-11; Gl 1,18)…

A tradição refere que Pedro esteve em Roma, onde morreu como bispo local após ter sofrido a crucificação de cabeça para baixo. A sua sepultura foi encontrada na basílica de São Pedro em Roma. Deve ter morrido no ano de 67, em dia incerto para nós.

Pedro tinha caráter impetuoso, coração generoso e ardente. Em Jo 6,68s, num momento de perplexidade, ele toma a palavra em nome dos demais Apóstolos; caminha ao encontro de Jesus sobre as águas, conforme Mt 14,28-33; Jo 21,7; quando Cristo anuncia sua Paixão, protesta com energia (Mc 8,32; Mt 16,22) ; no jardim das Oliveiras, desembainha a espada e fere Malco (Jo 18,10)…

1.2. A autoria e os destinatários da 1Pd

1. Ao Apóstolo Pedro a tradição, através de numerosos testemunhos, atribuí a autoria da 1Pd. Até em 2Pd 3,1 encontramos referência a uma carta precedente, escrita pelo Apóstolo Pedro.

O exame do texto da 1Pd confirma tal noticia:

O autor se apresenta como Pedro (1,1), testemunha da Paixão de Cristo (5,1); refere-se a Marcos como seu filho – o que corresponde a antiga tradição, que apontava Marcos como colaborador de Pedro. Como testemunha ocular, alude aos sermões e feitos de Jesus; cf. 3,14;4,14 e Mt 5,10-12 2,12 e Mt 5,16 2,6-8 e Mt 21,42

A freqüente recordação da Paixão de Cristo (cf. 1,18s; 2,21-25; 3,18; 4,1.13s) corresponde ao modo como Pedro prega em At (cf. At 2,23; 3,13-15; 4,9-12).

Contra a autoria petrina de 1Pd objetam-se a correção e a linguagem discreta da epístola; segundo alguns críticos, tal estilo não pode convir a um pescador da Galiléia, que, segundo At 4,13, era iletrado. A propósito observe-se:

a) o ser iletrado de Pedro podia significar apenas que não tinha freqüentado escola rabínica como Paulo;

b) o Apóstolo pode ter assimilado um tanto de cultura helênica, que penetrara na Palestina, É de notar, por exemplo, que, quando alguns gregos quiseram ver Jesus, pediram a Filipe, de Betsaida da Galiléia (cidade natal de Pedro), que os introduzisse junto ao Divino Mestre; aliás, Filipe e André (irmão de Pedro) são nomes gregos – o que bem mostra quanto a cultura grega se tornara natural entre os próprios Judeus da Palestina;

c) o Apóstolo Pedro recorreu a Silvano como escriba ou talvez redator (cf. 5,12). Ora Silvano ou Silas era cidadão romano (cf. At 16,19.37s) e companheiro de Paulo na segunda e na terceira viagens apostólicas (cf. At 15,40­18,5; 1 Ts 1,1; 2Ts 1,1; 2Cor 1,19). Silvano pode ter colaborado para a pureza da linguagem de 1 Pd assim como para dar certo colorido paulino à 1 Pd.

Não tem fundamento a sentença segundo a qual Silvano teria escrito toda a 1 Pd, de acordo com as idéias de Pedro, muito depois da morte do Apóstolo.

2. Os destinatários da carta eram cristãos esparsos pela Ásia Menor (Ponto, Galácia, Capadócia, Ásia, Bitínia: 1,1). Eram, em grande maioria, convertidos do paganismo; cf. 1,14.18; 2,9s; 3,6; 4,3. Não se exclui, entre eles, a presença de judeu-cristãos, vista que eram freqüentes os judeus naquela região.

Esses fiéis sofriam de várias tribulações (cf. 1,6s; 3,14; 4,12; 5,7.9). Houve quem as quisesse identificar com as perseguições desencadeadas por Domiciano (81-96) ou Trajano (98-117), o que nos levaria a época muito posterior à de S. Pedro. Na verdade; tratava-se de sofrimentos devidos a injúrias e calúnias que os convertidos experimentavam por causa da sua pureza de vida; os concidadãos pagãos os tinham como lucífugas (gente que foge da luz) e hostis ao consórcio dos homens pelo fato de não participarem das orgias dos gentios (cf. 4,4); eram acusados como malfeitores pelos antigos companheiros de vida desregrada (cf. 2,12; 3,16,4,14s). Além disto, os judeus, geralmente infensos aos cristãos nos primeiros decênios, não deixavam de atribular a vida destes. Ora, em tais circunstâncias, era de temer que os cristãos pressionados cedessem aos adversários e retomassem os hábitos depravados de outrora.

Foi por isto que o autor de 1 Pd muito enfatizou a dignidade da vocação cristã (2,1-10, especialmente 2,9), a necessidade e fecundidade do sofrimento, que redunda em purificação da fé (1,6-9), a imitação e a participação da Paixão de Cristo (2,21-25). Incute-lhes que a melhor resposta aos caluniadores é a retidão da vida e o cumprimento fiel dos deveres (3,13-17; 4,14-16).

Portanto, a finalidade da epístola não é doutrinária, mas exortatória ou parenética (cf. 5,12).

O lugar de redação deve ter sido Roma (cf. 5,13, onde Babilônia é alusão a Roma). Como data de origem, assinalamos os anos de 63-64 anteriores à perseguição de Nero, pois na 1 Pd não há indícios de tal perseguição.

A 1 Pd é valioso documento da vida cristã: fortalece o leitor para que, com paciência suporte as tribulações (cf. 1,6-9; 2,20-25; 4,13s, 5,6s); assim desenvolve a “teologia da cruz”. Eis as principais passagens de significado teológico: 1,2.19 (a redenção pelo sangue de Cristo); 2,5.9 (a dignidade sacerdotal do povo cristão); 3,19s (a descida de Jesus à mansão dos mortos); 3,22 (a ascensão do Senhor aos céus).

Lição 2: A epístola de Judas

A 2 Pd difere assaz da 1 Pd e muito mais se assemelha a Jd, da qual parece ser uma nova edição, ampliada e melhorada. Eis por que estudaremos Jd antes de 2Pd.

2.1. O autor de Jd

O autor da carta se chama “Judas… irmão de Tiago” (v. 1). Ora em Mc 6,3 e Mi 13,55 são mencionados, entre os primos de Jesus, Tiago e Judas. É de crer que este seja o autor da carta em foco. – Outra sentença julga que tal autor é o próprio Apóstolo Judas, de cognome Tadeu (= homem de coração), mencionado no catálogo dos Apóstolos (Lc 6,16; Aí 1,13; Mi 10,3; Mc 3,18). Contra esta tese, aponta-se o v. 17, no qual o autor se distingue do grupo dos Apóstolos.

Deve-se ainda notar que, embora os primos de Jesus fossem hostis ao Senhor (cf. Jo 7,2-5), alguns acreditaram nele posteriormente (cf. At 1,14) e colaboraram no apostolado com Paulo e os onze (cf. 1 Cor 9,5).

Muitos testemunhos da antiga tradição cristã reconhecem Jd como escrito canônico; todavia só houve unanimidade a respeito depois de uma fase de hesitação, devida ao tato de que Jd cita dois livros apócrifos; a Assunção de Moisés (v. 9) e o Apocalipse de Henoque (v. 14s); com o tempo, os cristãos tomaram consciência de que citar estes livros não significa tê-los por Inspirados; São Paulo citou mesmo os poetas pagãos Arato ou Cleantes em At 17,28; Epimênides em Tt 1,12; Menandro em 1 Cor 15,33; citou também tradições não canônicas dos judeus em 2Tm 3,8.

2.2 .Destinatários de Jd

Os leitores da epístola são cristãos de origem pagã e de origem judaica… De origem pagã, dada a facilidade com que se propagava entre eles a licenciosidade de costumes… (w. 8.12.16.18.). De origem judaica, por causa do amplo uso do A.T. e dos apócrifos judaicos (w. 5.7.9.11.14s). – Talvez se trate dos mesmos leitores aos quais S. Tiago escreveu (pois Judas se apresenta como “irmão de Tiago”, v. 1).

Tais fiéis estavam sendo ameaçados pela pregação de falsas doutrinas, levadas por cristãos apóstatas, que se entregavam aos mais baixos vícios do paganismo (v. 12.18), negavam a divindade de Cristo (v. 8), injuriavam os anjos (v. 8), zombavam das verdades pregadas pelos Apóstolos como se fossem fábulas (vv. 3 e 4) e causavam divisões nas comunidades (v. 19). É difícil identificar pelo nome tal facção herética; podiam ser discípulos de Simão Mago (cf. At 8,18-24), mal afamados na Tradição; defendiam teses que constituiriam no séc. II o corpo doutrinário da gnose.

O tom da carta é vivaz, enérgico e rude. A linguagem grega é polida (tenha-se em vista especialmente a doxologia final, vv. 24s); as metáforas são várias e pitorescas (cf. vv. 12s). Esse breve escrito contém dez palavras que nunca mais ocorrem em todo o Novo Testamento. Todos estes elementos levam a supor que Judas tenha adquirido boa cultura helenística ou, melhor, que tenha recorrido a um redator para escrever a carta. Ele o terá feito entre os anos de 62 (morte de São Tiago) e 66 (início da guerra dos judeus contra Roma, que acabou com a destruição de Jerusalém em 70).

2.3. Jd e 2Pd

Chama-nos a atenção a grande afinidade entre Jd e 2Pd: em ambas aparecem as mesmas expressões raras, as mesmas idéias, especialmente quando se trata de descrever os falsos pregadores e os espécimes do juízo de Deus sobre os malvados. Veja-se a seguinte tabela:

Jd4 – 2Pd2,1
Jd6 – 2Pd 2,4.9
Jd7 – 2Pd2,6
Jd8 – 2Pd2,10
Jd10 – 2Pd2,12
Jd11s – 2Pd 2,13-15
Jd13 – 2Pd2,17
Jd16 – 2Pd2,18
Jd17 – 2Pd3,1s
Jd18 – 2Pd3,3

É muito provável que haja dependência da 2Pd em relação a Jd, e não vice-versa. Na verdade, a 2Pd parece retomar Jd em seu capítulo 2, melhorando os textos de Jd: por exemplo,

  • Em Jd 4 é dito brevemente que os ímpios se infiltravam na Igreja; em 2Pd 2,1-3 esses ímpios são minuciosamente descritos.
  • Em Jd 5-7 são enumerados os castigos de Deus sem ordem cronológica (Israel no deserto, os anjos maus, Sodoma e Gomorra). Em 2Pd 2,4-6, a ordem cronológica é retificada; ao que 2Pd 2,5-7 acrescenta a salvação de Noé e Ló, que não pereceram no castigo enviado aos pecadores.

Note-se também como a 2Pd corrige Jd: em Jd 12 há menção de nuvens sem água (o que é paradoxal), ao passo que em 2Pd 2,17 se fala de fontes sem água. A 2Pd elimina a citação dos apócrifos; cf. Jd 9 e 2Pd 2,11; Jd 14s e 2Pd 2,17.

Assim passamos para o estudo da 2Pd.

Lição 3: A 2Pd

2.1. O autor de 2Pd

Tem-se discutido a questão do autor da 2Pd.

Nos três primeiros séculos, os escritores cristãos hesitavam sobre a autoria petrina da carta. Somente no século IV se firmou o consenso sobre o nome do Apóstolo S. Pedro.

1) Em favor da autoria petrina, cita-se:

  • o nome com que o autor se apresenta em 2Pd 1,1;
  • a referência à presença no monte da transfiguração em 2Pd 1,18(cf. Mt 17,1-9);
  • a menção de uma epístola anterior dirigida aos mesmos leitores e que seria a 1 Pd; cf. 2Pd 3,1;
  • a designação de “irmão caríssimo” atribuída a Paulo, em 3,15;
  • a referência à proximidade da morte, predita por Jesus, lembra Jo 21,18s (cf. 2Pd2,13-15).

2) Contra a autoria petrina, apresentam-se os seguintes pontos:

  • a linguagem e o estilo da 2Pd muito diferem dos que ocorrem na 1 Pd; a maioria das palavras são diferentes, mesmo quando indicam os mesmos acontecimentos;
  • em 2Pd 3,16 tem-se a impressão de que as cartas paulinas já estão reunidas numa só coleção, o que supõe certo intervalo após a morte de S. Paulo;
  • a descrença de muitos em relação à segunda vinda de Cristo supõe época tardia; cf. 2Pd 3,8s. A 1 Pd anunciava a parusia como próxima; cf. 1 Pd 4,7; 5,1;
  • o autor apresenta a primeira geração como passada (3,4), e parece distinguir-se dos Apóstolos (3,2), embora se diga Apóstolo em 1,1.

Diante destas diferenças os estudiosos admitem um redator para a 2Pd (Silvano; cf. 1Pd 5,12). Outros, porém, julgam (e talvez com mais razão) que um discípulo posterior a Pedro, e a nós desconhecido, apresentou o seu próprio escrito como sendo de São Pedro, a fim de lhe dar mais autoridade; devia pertencer aos círculos que dependiam do Apóstolo, talvez tenha utilizado um escrito proveniente de Pedro, escrito que ele adaptou e completou com o auxílio de Jd. – Esta hipótese não se opõe à inspiração e à dignidade do texto bíblico; os antigos eram mais liberais do que nós na tocante a direitos autorais e propriedade literária: estavam também acostumados ao uso de pseudônimos (cf. Eclesiastes e Sabedoria literariamente atribuídos a Salomão).

Aliás, para o cristão, basta que a epístola tenha sido reconhecida pela Igreja como canônica e represente um legado da época dos Apóstolos. O autor queria prevenir seus leitores (genericamente indicados em 1,1) contra a invasão de falsas doutrinas (2Pd 2), como também lembrar-lhes verdades fundamentais: a participação na natureza divina pela graça (1,4), o caráter inspirado das Escrituras (1,20s), a certeza da parusia futura (3,3-13).


Perguntas sobre as Epístolas de Pedro e Judas

1) Procure nos Evangelhos três passagens em que Pedro toma a dianteira sobre os demais Apóstolos. Faça o mesmo no livro dos Atos.

2) Onde é que a 1 Pd fala do batismo, cuja imagem foi o dilúvio? Queira explicar esse texto.

3) A 1Pd cita Is 53? Queira explicar em que contexto e com que finalidade.

4) A partir do texto de Jd, descreva o tipo de hereges e de heresias que ameaçavam os leitores da

5) Jd 3 fala da fé “uma vez por todas confiada aos santos”. Queira explicar o sentido desta expressão.

6) Ponha lado a lado numa folha o texto de Jd 3-19 e o de 2Pd2,1-22 e sublinhe com tinta vermelha o que lhes é comum.

7) Em 2Pd2,13 e em Jd 12 há referência a banquetes e ágapes (refeições fraternais). Trata-se da Eucaristia?

8) Que diz 2Pd 1,19-21 sobre a profecia e as Escrituras ?